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Morfologia urbana de Salvador, BA: uma análise sobre a segregação espacial

Morfología urbana de Salvador, BA: un análisis sobre la segregación espacial

Urban morphology of Salvador, BA: An analysis of spatial segregation

Julia Dias Gomes
Programa de Pós-graduação em desenvolvimento regional e urbano. Universidade Salvador,, Brasil
Marcia Maria Couto Mello
Programa de Pós-graduação em desenvolvimento regional e urbano. Universidade Salvador, Brasil

Morfologia urbana de Salvador, BA: uma análise sobre a segregação espacial

Arquisur revista, vol. 14, núm. 25, pp. 32-49, 2024

Universidad Nacional del Litoral

Recepción: 31 Marzo 2024

Aprobación: 06 Mayo 2024

Resumo: Este artigo oferece uma análise sobre a morfologia urbana de Salvador, Bahia, destacando as questões da segregação espacial que moldam a cidade. O estudo examina a estrutura física e a organização espacial de Salvador, abordando como esses fatores influenciam na segregação socioeconômica da cidade. Este trabalho objetiva em investigar de que forma a configuração da segregação socioespacial pode influenciar sobre as relações entre estratos sociais distintos. Partindo dessa premissa, busca-se realizar a análise espacial, utilizando como ferramenta o programa de computação Space Sintax . Os resultados permitem uma visualização sobre como os diferentes padrões de configuração e a caracterização dos setores socioeconômicos revelam a leitura da morfologia urbana sobre a segregação em Salvador.

Palavras-chave: morfologia urbana, Salvador, segregação espacial, sintaxe espacial.

Resumen: Este artículo ofrece un análisis de la morfología urbana de Salvador, Bahía, destacando las cuestiones de segregación espacial que dan forma a la ciudad. El estudio examina la estructura física y la organización espacial de Salvador, abordando cómo estos factores influyen en la segregación socioeconómica de la ciudad. Este trabajo tiene como objetivo investigar cómo la configuración de la segregación socioespacial puede influir en las relaciones entre diferentes estratos sociales. Partiendo de esta premisa, buscamos realizar análisis espaciales, utilizando como herramienta el programa de computación Space Syntax. Los resultados permiten visualizar cómo los diferentes patrones de configuración y la caracterización de los sectores socioeconómicos revelan la lectura de la morfología urbana sobre la segregación en Salvador.

Palabras clave: morfología urbana, Salvador, segregación espacial, sintaxis espacial.

Abstract: This article provides an analysis of the urban morphology of Salvador, Bahia (Brazil), focusing on the spatial segregation issues that shape the city. The study examines the physical structure and spatial organization of Salvador, addressing the influence of these factors on the socioeconomic segregation of the city. Also, the configuration of sociospatial segregation is analyzed to study its influence on the relationships among distinct social strata. Based on this premise, we seek to perform a spatial analysis using the software Space Syntax as a tool. Results show how the various configuration patterns and the characterization of socioeconomic sectors reveal an interpretation of the urban morphology of segregation in Salvador.

Keywords: urban morphology, Salvador, spatial segregation, space syntax.

1. Introdução

A dilatação dos perímetros urbanos possibilita a disseminação da construção do território. A cidade se espalha, resultando na configuração de tecidos urbanos, consolidados ou emergentes, que podem apresentar padrões dispersos ou descontínuos, pois encontram-se em um mundo cada vez mais tomado pela expansão dos centros urbanos e pela necessidade da reorganização desses espaços.

Para Lefebvre (2001), o tecido urbano é definido como um ecossistema, uma unidade coerente constituída ao redor de uma ou de várias cidades, antigas ou recentes, não se limitando à sua morfologia, mas como suporte de um modo de viver da sociedade urbana. Trazidas pelo tecido urbano, a sociedade e a vida urbana penetram nos campos, sejam eles de objetos ou valores. A sociedade urbana é, então, resultado do processo de industrialização, o qual determinou a explosão das antigas formas urbanas, herdadas de transformações descontínuas que conceberam a atual sociedade.

O conceito de segregação socioespacial é fundamental para a análise do processo de produção do espaço urbano. Ela é uma das faces mais importantes da exclusão social que se entende desde o começo da urbanização nas metrópoles. Vieira e Melazzo (2003) destacam que a origem deste conceito teve início com os pensadores da Escola de Chicago, nas décadas de 1930 e 1940, ao considerarem que a segregação consiste em uma característica presente em todas as cidades, sendo a segregação urbana definida por diferentes grupos ou classes sociais localizadas em lugares distintos e separados, apontando-a como um processo decorrente da produção e organização do espaço urbano.

Entendida como um processo fundamental para a compreensão da estrutura espacial, a segregação pode ser conceituada como “um processo no qual diferentes classes ou camadas sociais tendem a se concentrar cada vez mais em diferentes regiões gerais ou conjuntos de bairros da metrópole” (Villaça, 2017:142). O que determina em uma região a segregação de uma classe é a sua concentração mais significativa em um lugar do que em outras áreas da cidade (Villaça, 2017; Corrêa, 1989).

Netto (2014) associa a segregação à dificuldade de interação entre grupos socialmente diferentes, impondo-se sobre os atos da cidade e impactando na probabilidade de encontro e contato entre os diferentes. Para Netto (2014:48), “uma definição da segregação como restrição da interação significa trazer ao centro do problema a importância estrutural do encontro na integração de um sistema social”. A abordagem leva a entender que a segregação é uma consequência de como o espaço e o tempo se configuracionam, envolvendo a presença e a ausência dos atores socialmente diferenciados sobre os espaços.

No Brasil, a questão do planejamento urbano continua passando por intensas transformações. Segundo Saboya (2001), uma visão mais flexível, negociada e estratégica vem tomando lugar sobre a visão racional. A mudança de visão, deve corresponder a uma mudança no modo como as tarefas que fazem parte do planejamento podem fornecer apoio a este processo. Nesse contexto, faz-se necessário desenvolver novos métodos de análise, que possam trazer praticidade e fornecer respostas com eficiência e rapidez.

Para interpretar as formas urbanas, estejam elas representando os bairros consolidados ou os vetores de crescimento, uma análise sobre a mancha urbana é indispensável para se compreender as relações estabelecidas ente um determinado ponto com os demais que possam ser demarcados no espaço urbano. Villaça (2017) complementa que o entendimento do espaço para explicar a questão social é tão importante quanto explicá-lo somente pelo social. Desta maneira, é necessário que as análises espaciais explorem a forma de trazer uma nova perspectiva aos estudos sobre as cidades, além de testar as formas espaciais sobre as observações funcionais, com o objetivo de melhorar as descrições humanas sobre o espaço.

Uma análise sobre a configuração da segregação socioespacial ajuda a compreender a dinâmica social e territorial de grupos sociais heterogêneos, sobre as proximidades e as distâncias reproduzidas no espaço urbano. Trazer a cidade de Salvador como objeto desta pesquisa, que estabelece relações com outras áreas do saber, gera a possibilidade de utilizar os resultados obtidos em pesquisas a serem desenvolvidas em campos diversos.

Atualmente, Salvador carrega em seu traçado urbano e social marcas decorrentes de todo o seu processo de ocupação. Com o seu território quase totalmente ocupado, percebe-se a diversidade nas formas de uso e na ocupação do solo (Ferreira, 2009). Marcada principalmente pela segregação socioespacial, a capital baiana ainda se depara com muitos contrastes e desigualdades, como consequências de toda a sua história que está marcada no tecido urbano.

A Teoria da Sintaxe Espacial, a partir de medidas de integração por meio dos mapas axiais, fornece suporte para a compreensão do objetivo estabelecido. A análise socioespacial investiga a relação entre espaço/sociedade, buscando compreender a dinâmica de Salvador.

Destaca-se que a proposta de aprofundar o campo da Sintaxe Espacial como ferramenta para auxiliar na compreensão da segregação em Salvador ocorre de forma inédita. Portanto, essa pesquisa busca trazer contribuições não só acerca do estudo da segregação, mas também demonstrar como a análise sintática se comporta sobre o traçado urbano da cidade.

Para tanto, aborda-se inicialmente as propriedades e aplicações da Sintaxe Espacial, a fim de traçar uma compreensão sobre a metodologia adotada, que é apresentada em seguida. A parte da análise espacial sobre a cidade de Salvador/BA busca apresentar os resultados obtidos sobre as análises espaciais e suas relações com a configuração da cidade, abordando como a análise dos mapas gerados a partir da sintaxe espacial descrevem e condizem com a condição da cidade, em especial no olhar sobre a segregação socioespacial. As considerações finais buscam relatar uma síntese do trabalho construído.

2. Sintaxe espacial: Propriedades e aplicações

As principais questões levantadas por Hillier e Hanson (1989) para o desenvolvimento da Sintaxe Espacial, em Londres, na década de 1970, foram norteadas por essas perguntas: “o desenho espacial tem consequências para os padrões de vida espacial que acontece neles? a vida espacial tem consequências para a patologia social?” (Hillier et al.1986:1; Holanda, 2018:81.) Os autores definem que a Sintaxe Espacial (SE) busca explorar a relação entre a configuração ou a estrutura do espaço e o seu padrão de movimento, possibilitando uma série de encontros, com propriedades estruturais que variam de acordo com as relações da configuração urbana.

O principal objeto de estudo da SE é a configuração do espaço, onde não só se reproduz a relação hierárquica existente, mas ajuda a produzir padrões de relações sociais (Bafna, 2003). O método é único, ao relacionar as propriedades espaciais do meio urbano às características socioeconômicas e consiste em quatro pontos que abrangem: uma definição concisa do espaço; proporciona uma família de técnicas para analisar as cidades como uma rede espacial; é um conjunto de técnicas para correlacionar as redes espaciais aos dados socioeconômicos e fornece um conjunto de teorias sobre como o espaço urbano se relaciona com fatores sociais, econômicos e cognitivos.

Quanto aos seus efeitos, a configuração espacial influência no fluxo de movimento e estabelece uma relação com as atividades econômicas. Segundo os teóricos Hillier, Hanson, Peponis, Hudson, Burdett (1983), os princípios adotados sobre a sintaxe espacial que afetam o padrão de movimento e uso do espaço são: a inteligibilidade do espaço, definida pela correlação entre a integração global e o controle local; a continuidade de ocupação, mapeando onde estão as áreas ocupadas ou não ocupadas do espaço e a previsibilidade do espaço como o padrão de encontro que pode ser previsto de seu padrão espacial.

Na figura 1, é possível perceber como o mapa axial ajuda a compreender graficamente a configuração do espaço a partir do exemplo da cidade de Berlim, antes e depois da queda do muro. Conforme se observa no mapa, a centralidade não se comporta como algo estático, mas como um processo dinâmico. Inclusive, é possível perceber que o mapa de integração auxilia a visualizar como as cidades se estruturam a partir de suas perspectivas históricas.

Mapa axial de Berlim com a cidade dividida pelo muro (1986) e depois da queda (1995) – Integração Global
Figura 1
Mapa axial de Berlim com a cidade dividida pelo muro (1986) e depois da queda (1995) – Integração Global
Fonte: Desyllas, 1997

Para a construção de uma linha axial, ela parte de uma via do sistema urbano. Ela então é decomposta no maior número possível de retas interligadas, que representa as inflexões que essa via provoca para direcionar a outras rotas possíveis. Desta forma, os menores caminhos terão os maiores valores, chamados valores de integração, que se expressam na malha urbana como áreas mais centrais entre o conjunto das vias. O sistema de integração entre as variáveis morfológicas é correspondente ao sistema urbano (Netto e Krafta, 1999).

O mapa de axialidade é produto da inserção da malha viária, refletindo o menor número de linhas retas que passam através de todos os espaços. Os elementos podem ser analisados globalmente ou localmente. No primeiro caso, considera-se o número de vezes que uma linha axial é cruzada por outras, e, no segundo, interessam as características de articulação dos elementos entre si. Por isso, determina-se a conectividade do sistema por meio da profundidade ou integração das linhas que se interceptam (Holanda, 2018). A malha axial é geralmente obtida pelo traçado do sistema viário da cidade, a partir de uma base cartográfica disponível, como é possível perceber na figura 2, onde (A) corresponde ao traçado de uma linha reta sobre cada via. (B) A fração da malha obtida é traduzida em um mapa axial quantificado, permitindo a construção de uma matriz de conexões. (C) A matriz permite a construção de mapas colorizados que indicam os valores de integração, com raio global (Rn).

Processo de construção do Mapa Axial em trecho da cidade de Salvador
Figura 2
Processo de construção do Mapa Axial em trecho da cidade de Salvador
Fonte: elaborado pelas autoras, 2021.

Medeiros (2013) cita que por meio das linhas axiais é possível obter uma representação linear do espaço, sendo utilizada para a investigação do movimento e dos aspectos urbanos, ao se pensar a cidade como um conjunto de espaços conectados por perspectivas. As linhas axiais possuem propriedades globais e locais, indicado pela Sintaxe Espacial. A análise global (Rn) leva em conta todas as conexões a partir de todos os elementos do espaço, ou seja, levando toda a cidade em consideração, onde R representa o raio de eixos que se deseja considerar a partir de um outro qual- quer, e n o número ilimitado de conexões. A análise local (R3) considera um número n de ligações a partir de uma linha axial, tendo o terceiro nível (R3) como inicial.

Os valores de integração são os potenciais de acessibilidade dos eixos do sistema, representando o grau de facilidade de deslocamento do sistema viário, que permitem comparar as médias dos eixos na escala global (de cidades) e local (de bairros ou setores de uma cidade). Na análise dos segmentos, diferente da análise axial, cada linha é considerada como uma unidade inteira, quebrando os eixos nas suas interseções, calculando cada segmento de forma independente, permitindo uma análise de acessibilidade, integração e conectividade mais detalhada. No entanto, as medidas aplicadas neste tipo de análise são similares às da análise axial: as cores (do vermelho ao azul) agora indicam maior potencial de acessibilidade nas cores quentes, e menor potencial nas cores frias.

As medidas da análise de segmentos se dividem em: conectividade, apresentada na escala local, mostrando as de possibilidades de percursos que o pedestre pode escolher; comprimento dos segmentos, que se refere ao tamanho métrico de cada segmento; integração, sendo a principal medida da Sintaxe Espacial, que capta as proximidades e distâncias, ou seja, a acessibilidade aos extremos da malha e as vias mais importantes; escolha, calculando a possibilidade de se atravessar um segmento a partir de todos os outros pontos de origem ou destino (atravessamento); integração + escolha, combinando as medidas de integração e escolha, mostrando quais espaços minimizam a integração e ao mesmo tempo apresentam potencial de escolha, refletindo o potencial de movimento da sociedade sobre o espaço; step-depth, com base em um ponto específico do espaço em relação ao todo, possibilitando compreender o grau de complexidade do tecido urbano em escala humana (Castro, 2016; Hillier e Iida, 2005; Hillier, 2008).

Entende-se que a SE busca contribuir para as análises das malhas urbanas como uma ferramenta técnica, pois esse método indica como a dinâmica socioespacial das cidades se configuraciona a partir da mudança de integração. O método entende a cidade como um sistema espacial e funcional, sendo derivado, muitas vezes, da rede do sistema viário, entre a estrutura espacial da cidade e sua função.

A SE contribui para o entendimento da estrutura espacial da cidade como um objeto moldado pela sociedade e, inversamente, como essa estrutura espacial pode gerar e afetar certos processos socioeconômicos na sociedade, promovendo um entendimento sobre as possibilidades espaciais como o crime, a segregação social e o comportamento antissocial. Entende-se que esta técnica demonstra como a integração e a segregação condicionam o espaço, analisando a forma que como o posicionamento de uma rua, por exemplo, pode influenciar também na atividade econômica (NES, 2014).

Ao defender a técnica da SE, Nes (2014) complementa que se pode questionar o que acontece com as ruas extremamente segregadas, ao se perceber como elas possuem rotas mais complexas na malha viária. Com a estrutura urbana visualmente fragmentada e com poucas opções de acesso, podem se constituir ruas com altos índices de crimes e deterioração. As mesmas investigações permitem que a organização espacial gere movimentos de acordo com os padrões de copresença e co-conscientização do ambiente construído. Como resultado destas análises obtém- se uma representação gráfica de como o espaço construído pode afetar o comportamento humano. Portanto, a Sintaxe Espacial deve ser lida de forma associada à estrutura do local e não às suas características.

Dessa forma, a SE possibilita visualizar como o tecido urbano tem a capacidade de revelar a forma com que as classes socioeconômicas se dispõem sobre uma cidade, destacando os sistemas de permeabilidades e barreiras, vetores de crescimento e um campo de possibilidades sobre como o planejamento urbano pode construir uma rede mais integrada e acessível para a população.

3. Metodologia

Para a caracterização espacial da área de estudo, a cidade de Salvador, utilizou-se a Sintaxe Espacial, sendo o mapa de segmentos a ferramenta escolhida para representação e análise. O desenho de Salvador encontra-se disponível no site do Urbanidades por Renato Saboya (2017), a partir da Base Cartográfica do OpenStreetMap (2016), com imagens de satélite do Google Earth (2016).

As medidas sintáticas referentes a cada segmento do mapa possibilitarão a análise da configuração espacial da segregação, onde se escolheu trabalhar com a medida métrica. Esta, por sua vez, considera a localização a partir de um raio métrico especificado, sendo útil para análises na escala do pedestre. Para a análise foram escolhidas as medidas de Integração e Integração+Escolha.

O desenho de Salvador foi atualizado para Mapa Axial, e posteriormente transformado em Mapa de Segmentos, utilizando o software DepthMap®. As medidas de integração e escolha foram normalizadas conforme Hillier, Yang e Turner (2012). Através do mapa de segmentos gerado, calculou-se as medidas sintáticas de Integração Global (Rn), Local (R=1200 m) e Escolha Global (Rn). A escolha do raio local equivale a cerca de 15 minutos de caminhada.

O software DepthMap® gerou gráficos para as análises de Inteligibilidade – correlação entre a integração local e global, medindo a combinação de forças (sinergia) entre a acessibilidade global e local, e Acessibilidade – correlação entre integração e escolha (Medeiros, 2006).

Para a análise sintática e seus valores obtidos, os mapas gerados foram exportados para o software QGIS®. As simbologias utilizadas foram escolhidas seguindo Hillier, Yang e Turner (2012) para representação da malha espacial.

4. Análise Espacial na cidade de Salvador/BA

Salvador, em sua configuração atual, demonstrada na figura 3, possui estagnação econômica e acentuados níveis de desigualdade, vistos no espaço como a segregação. Atualmente, a cidade compreende uma população de 2 414 005 em 2022 de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e densidade demográfica de 3486,96 hab/km². Sua área territorial corresponde a 693,453 km², marcada fortemente pela ocupação populacional. Possui 196,26 m² de área urbanizada (IBGE, 2019), e apresenta 92.8% de domicílios com esgotamento sanitário adequado, 39,5 % de domicílios urbanos em vias públicas com arborização e 35 % de domicílios urbanos em vias públicas com urbanização adequada (presença de bueiro, calçada, pavimentação e meio-fio) (IBGE, 2010). Além disso, em 2021, o IBGE registrou 33,2 % dos moradores da capital baiana encontravam-se abaixo da linha da pobreza, o que significa que 937 mil pessoas viviam com rendimento domiciliar per capita inferior a R$ 475 por mês, estando apenas abaixo de São Paulo (2,1 milhões, 16,9 % da população) e Rio de Janeiro (1,1 milhão, 16,6 % da população).

Mapa de Salvador e bairros
Figura 3.
Mapa de Salvador e bairros
Fonte: elaborado pelas autoras, 2021.

A Sintaxe Espacial proporciona modelar o cenário presente e o passado, simular as situações futuras e avaliar o desempenho espacial. Ela se constitui como um suporte à interpretação urbana. Os potenciais da configuração espacial expõem os potenciais de movimento, que são normalmente associados aos fluxos resultantes das articulações entre o ambiente construído. O potencial de movimento oriundo da configuração espacial propõe implicações na dinâmica e na qualidade dos assentamentos e ocupações humanas. Dessa forma, a SE pode ser uma ferramenta para explicar o movimento, a configuração e a atração da dinâmica do espaço urbano. O histórico de ocupação de Salvador demonstra que os três vetores de expansão urbana continuam norteando o sentido do traçado, sua tendência de movimento e integração espacial, sendo por meio da orla marítima, do miolo e pelo subúrbio.

Segundo Carvalho e Pereira (2008), o primeiro vetor, a orla marítima, constitui a área nobre da cidade comportando a maioria dos investimentos públicos, equipamentos urbanos e interesse da população. O segundo, localizado no centro geográfico da cidade começa a ser ocupado em sua maior parte por conjuntos habitacionais para a classe "média baixa", assim como é o local de muitas invasões e grande carência de equipamentos urbanos. O terceiro vetor é localizado no subúrbio e tem sua ocupação impulsionada pela construção da linha férrea em 1860, sendo a partir da década de 1940, um local de invasão e ocupação de loteamentos populares, compondo hoje a área mais problemática da cidade.

É possível perceber que a configuração da segregação na cidade dá-se pela forma como descreveu Oliveira (2015), sendo o modelo centro-periferia, ou de classes, onde a elite segue uma direção de ocupação que atrai os investimentos e acessibilidade, enquanto as classes mais pobres concentram-se nas franjas periurbanas e áreas periféricas da cidade. Não somente disso, Villaça (2017) caracteriza a escala da segregação como a concentração das classes sociais em bairros distintos da cidade, o que se revela no tecido urbano tanto em análises global e local.

No contexto global, percebe-se que as principais vias estruturantes condicionam o caráter integrador e também exercem um papel importante sobre suas influências nas partes segregadas. A escolha global evidencia que as vias estruturantes condicionam o critério de escolha sobre o movimento. A análise local determina em uma escala mais detalhada como se configuraciona o tecido urbano nas áreas segregadas, ou seja, como se compõe os padrões morfológicos de Salvador.

A segregação socioespacial em Salvador não é somente condicionada por seus vetores de ocupação e distribuição das classes sociais. É importante citar o papel que a topografia da cidade interfere sobre sua morfologia, onde Medeiros (2006) descreve que a irregularidade do traçado pode agir como um elemento excludente da vitalidade urbana ampliando a segregação e exclusão espacial.

Integração Global (Rn) na cidade de Salvador

O contexto global (Rn) identifica as zonas mais integradas de Salvador, ou seja, qual o nível de importância que as vias estruturantes exercem sobre a acessibilidade nessa escala. As vias mais integradas compõem-se também com os vetores de expansão urbana da cidade, tendo suas vias principais a BR-324, a Avenida Luís Viana (Paralela) e a Avenida Octávio Mangabeira (Orla). Essas vias exercem tanto o papel de vetor de crescimento como de vias integradoras no contexto global.

O núcleo de integração continua muito próximo de seu núcleo de formação original, onde as zonas mais integradas concentram-se próximas aos bairros do Comércio – que compreende o centro histórico e os bairros Caminho das Árvores, Pituba e Itaigara, onde se localizam serviços como shoppings, rodoviária, e centros empresariais.

No que tange ao traçado urbano, a zona histórica, centro inicial, e a zona do centro empresarial desempenham o papel dos núcleos integradores na cidade. A conexão entre esses centros integradores dá-se pelas vias principais da cidade: Av. Paralela e BR-324.

O mapa de segmentos da análise global, representado na figura 4, retrata como a segregação pode ser caracterizada por meio da análise do traçado urbano. Os valores de integração foram divididos em seis faixas, com base na divisão apresentada por Kronemberger (2016), no qual utiliza a classificação por quebras naturais.[1] Além disso, a dificuldade de interação entre os diferentes estratos sociais não somente pode ser identificada como restrição ao contato social e ao espaço social (Netto, 2014). Reconhecendo as circunstâncias históricas que também contribuem para a atual dinâmica espacial, o mapa de segmentos revela que a localização das classes sociais ainda segue características históricas.

Mapa de segmentos da análise global (Rn)
Figura 4.
Mapa de segmentos da análise global (Rn)
Fonte: elaborado pelas autoras, 2021

De acordo com a perspectiva histórica de Salvador, os estratos mais ricos tendem a se concentrar na porção sul da cidade, assim como seguir o vetor de crescimento pela orla marítima. Essa tendência de localizarem-se nessa região pode ser explicada pela alta valorização local, onde historicamente era a área escolhida para implantar investimentos em infraestrutura e equipamentos urbanos.

Desta maneira, a integração global apresenta interferência sobre onde localizam-se a maior concentração de pretos e pardos em Salvador. Bairros no miolo, como por exemplo, Cajazeiras, estão muito distantes das vias estruturantes e integradoras do sistema urbano, assim como bairros em todo o subúrbio da cidade, nos fazendo questionar o porquê da atuação do setor governamental tende a construir avenidas e demais equipamentos urbanos próximos aos centros de integração, e não investem no acesso desses bairros menos privilegiados, com alta concentração de pardos e pretos, com eixos estruturantes que possam melhorar a vida social.

Assim, cabe destacar o papel da distância social, discutido por França (2017), representa a forma com a qual as distâncias físicas podem ser consideradas distâncias sociais, abordando principalmente a proximidade física entre os grupos sociais distintos afeta na estrutura social, considerando a integração para os ricos é ligada as oportunidades criadas para esses estratos socioeconômicos.

Costa (2007) complementa que para Salvador, a proposta determinada pelo traçado viário levou em conta a utilização da topografia para a passagem das vias arteriais, no caso, as vias com maior integração. No entanto, segundo o autor, essa lógica possibilitou ordenar a cidade em torno de um modelo usual em escala metropolitana de "casa grande e senzala". O traçado proposto estabeleceu limites que contribuíram com o crescimento de localidades homogêneas, ao mesmo tempo em que estabeleceu barreiras que as manteriam separadas de outras localidades, mesmo que próximas.

Conforme Villaça (2017), a localização das classes mais ricas sobre uma determinada região não caracteriza uma homogeneidade sobre determinada região da cidade, mas sim a sua concentração significativa em uma região, induzindo investimentos públicos e a dominação dos agentes produtores do espaço. Por isso, as localizações das camadas populares encontram-se mais afastadas dos eixos integradores, o que indica um processo segregativo em uma direção do espaço urbano.

Fazendo uma retomada histórica da década de 1970, a construção das ‘avenidas de vale’ erradicou do tecido urbano mais valorizado sobre a concentração de classes mais pobres, que até então ocupavam essas áreas. Essa articulação dos investimentos públicos sobre áreas estratégicas da cidade impulsionaram a ocupação das classes menos abastadas para as franjas periurbanas e o miolo da cidade. Dessa forma, a hierarquia viária não somente determinou o sentido de crescimento da cidade, assim como ordenou a ocupação do território separado pelas classes sociais, induzindo a ação estratégica do Estado sobre tratamentos diferenciados para essas áreas, apoiando a então cidade formal e a informal (Costa, 2007).

O tecido urbano de Salvador evidencia pontos que refletem as mudanças ao longo dos séculos: com o decréscimo demográfico das áreas antigas centrais e expansão do crescimento para as franjas periurbanas, resultaram na formação de sistemas produtivos organizados reticularmente, com base para a consolidação de novas áreas de negócios fora do centro tradicional, integrando espaços cada vez mais extensos e articulados pelos eixos integradores (Carvalho; Pereira, 2008).

A consolidação do processo de ocupação, em seu contexto global, identifica as áreas mais segregadas concentradas no Subúrbio, Miolo e na parte sul de Salvador. O padrão de apropriação do espaço comprova que nos espaços mais integrados, compreendidos entre as avenidas Paralela e Octávio Mangabeira, concentram-se os equipamentos públicos e privados mais importantes da cidade, assim como o centro empresarial, oportunidades de trabalho e obtenção de renda, onde essas áreas também são ocupadas por sua classe média (Carvalho; Pereira, 2008).

O mapa de integração global fornece uma visualização dinâmica sobre como o traçado espacial também determina a localização das diferentes classes sociais, compondo a segregação socioespacial. Não obstante, uma visão sobre os eixos norte e sul do mapa indicam extremos altamente segregados, ao sul comportando a concentração dos mais ricos e, ao norte, ainda uma área pouco ocupada, mas composta de bairros com piores condições socioeconômicas.

Os eixos leste e oeste do mapa revelam, por um lado, a área leste marcada pelo vetor de crescimento urbano composto pela verticalização da tendência de expansão das classes mais ricas. O traçado urbano indica, em sua porção oeste, áreas segregadas compostas pela ocupação do subúrbio da cidade, embora ainda concentre uma zona integrada composta pelo centro histórico. Embora não esteja sendo considerado o valor do uso da terra nesta análise, o contexto histórico e os valores de integração apontam que a configuração da segregação reflete, de fato, a concentração das classes sociais diferentes sobre os espaços da cidade de acordo com a posição atual.

Os valores de integração foram distribuídos em seis faixas de análise, seguindo o critério de identificação de cores determinado pelo software Depthmap®. A figura 5 mostra a distribuição e a média dos valores de Integração Global (Rn). Em relação a distribuição dos valores por faixas, percebe-se que a maioria dos valores tendem a se concentrar entre as faixas 3 e 5, faixas medianas. Os maiores valores de integração, correspondente à faixa 1, representam apenas 6 % do total, enquanto os valores que indicam zonas mais segregadas, faixa 6, são 12 % do total. As médias de Integração Global (Rn) correspondem aos valores médios de integração para cada faixa.

Distribuição e média dos valores normalizados de Integração Global (Rn)
Figura 5.
Distribuição e média dos valores normalizados de Integração Global (Rn)
Fonte: elaborado pelas autoras, 2021.

As vias mais integradas e também com os maiores valores de escolha global indicam uma tendência de localização das classes privilegiadas próximas da orla marítima e de seu centro empresarial, enquanto as classes mais pobres tendem a se localizar nas franjas periurbanas e no miolo da cidade. Para tanto, a análise local fornecerá uma perspectiva sobre como o tecido urbano se compõe em uma escala mais aproximada sobre a cidade, indicando a ocupação das classes sociais.

Integração Local (R1200)

O contexto local foi definido com o raio de 1200 metros (R1200), equivalente a aproximadamente 15 minutos de caminhada para um pedestre. Observado na figura 6, o mapa de integração local revela um contraste em relação à integração global. Inicialmente, pode-se observar que as áreas mais integradas em escala local não estão próximas com as sinalizadas na escala global.

Integração local (R1200)
Figura 6.
Integração local (R1200)
Fonte: elaborado pelas autoras, 2021.

Essas diferenças de núcleos mais integrados, global e local, correspondem ao valor de correlação encontrada de 0,026. No entanto, cada escala permite identificar centralidades diferentes que em escala local correspondem às centralidades que estruturam alguns bairros.

As zonas mais integradas no contexto local demonstram melhores condições para estruturar a dinâmica urbana, facilitando o acesso a equipamentos e atividades ali existentes. Em Salvador, os bairros que apresentam os valores mais altos de integração estão localizados nas proximidades do centro histórico, compreendendo bairros como Calçada e Lobato, assim como em outros bairros como Tancredo Neves, Castelo Branco, e Itinga, localizados na conurbação com Lauro de Freitas.

Ressalta-se que, embora na escala local os bairros onde concentram as classes mais populares sejam os mais integrados, é neles que se encontram os mais altos índices de criminalidade. Os bairros que comportam as classes mais altas revelam um contraste na medida em que apresentam os menores valores de integração, portanto, maior segregação espacial. Áreas que possuem núcleos com valores medianos de integração podem ser encontrados em bairros como Pernambués, Nordeste de Amaralina, Itapuã, Bairro da Paz, São Cristóvão, Plataforma e Coutos.

Para Kronemberger (2016), os valores de integração global isolados tendem a caracterizar vias de passagem com concentração de equipamentos de uso específico, que dependem em sua maioria do transporte individual. Os valores mais altos e isolados de integração local tendem a incentivar uma concorrência com a distribuição dos serviços oferecidos. Quando os valores de integração local e global são simultaneamente altos, isso indica uma estrutura comercial e de serviços mais consolidada, promovendo a apropriação local e regional.

A Figura 7 demostra que as distribuições dos valores de integração para a escala local encontram-se presentes em maior quantidade sobre as faixas de 3 a 5, sendo o maior valor de integração (Faixa 1) apenas em 5 %, indicando que a cidade apresenta um tecido urbano com tendência muito alta de segregação na escala local. Destaca-se a importância do contexto histórico para fundamentar que nesta escala, é evidente o contraste entre a localização dos padrões de ocupação e das classes sociais. A média dos valores de integração local indica valores mais altos para a Faixa 1, em relação aos valores da escala global.

Distribuição e média dos valores normalizados e Integração Local (R1200)
Figura 7.
Distribuição e média dos valores normalizados e Integração Local (R1200)
Fonte: elaborado pelas autoras, 2021.

A forma como o traçado urbano se configuraciona tem consequências nas escalas global e local. Partindo então para uma análise mais detalhada sobre o padrão espacial, consideraram-se os estudos apresentados por Ferreira (2009) para identificar formas de ocupação e utilização do espaço pela população e setores de atividades econômicas. Essa ampliação (demonstrada nas Tabelas 1 e 2), representa o tipo de ocupação complementa a análise sintática em escala local, que pode ser investigada também na escala global.

Ferreira (2009) elencou treze categorias de ocupação que serão aqui utilizadas para descrever a urbanização e densidade de ocupação do solo. De acordo com as tabelas 1 e 2, nota-se a maneira como as diferentes classes sociais se distribuem sobre o espaço de acordo com o padrão de ocupação. Para a classificação, foi considerada a homogeneidade das áreas, porém, mesmo quando semelhantes, as áreas comportam alguma diferença interna. Desta forma, as tipologias escolhidas se caracterizam pela heterogeneidade decorrente do processo de produção do espaço.

Dentro desse contexto, a segregação pode ser caracterizada segundo o padrão de integração e de suas tipologias. A partir das fotografias demonstrando como se comporta a dinâmica de Salvador, bairros com altos valores de integração local possuem serviços que são, muitas vezes, destinados apenas à população local, abrangendo em sua maior parte a classe socioeconômica que se situa nessas áreas. Isso pode ser percebido em bairros como o Lobato, comportando uma zona de integração local que não possui abrangência global.

Carvalho e Pereira (2015) discorrem que a distribuição dos grupos e classes sociais no espaço é, em grande parte, produto da atuação do mercado imobiliário. A atuação da lógica imobiliária leva a filtrar o acesso dos grupos sociais a diversas regiões da cidade, principalmente causada pelo preço da terra urbana e das habitações. A sobrevalorização dos valores impostos sobre as localidades causa a diferenciação espacial, destacando os diferentes padrões de ocupação (visualizado nas tabelas 1 e 2), causando um impacto profundo na organização do espaço urbano em forma de fragmentação e segregação.

Pela análise da escala local, é possível também perceber um reforço sobre a centralidade histórica, tendo vários investimentos da prefeitura e volta de serviços públicos, nos quais já possui forte influência global e local sobre a cidade. É possível localizar no mapa do contexto local um adensamento sobre as franjas periurbanas, especialmente na região do subúrbio da cidade. Pelo traçado espacial, percebe-se uma regularidade maior sobre a parte da orla marítima, com exceção de alguns conjuntos habitacionais instalados décadas atrás que persistem até hoje.

Como destacam Carvalho e Pereira (2015) o movimento de volta a ocupação das centralidades aumenta a densidade das áreas centrais e próximas a elas ocorre com mais frequência em assentamentos populares já consolidados, sendo cada vez maior o aumento populacional e a ocupação constante sobre essas mesmas áreas construídas, passando por um processo de verticalização incremental, que consiste na construção de pavimentos superiores sobre imóveis já existentes, o chamado "puxadinho".

Embora com as mudanças ocorridas no decorrer dos anos, o processo da urbanização acompanha a segregação espacial em Salvador, destacando a ocupação da orla marítima pelas camadas mais altas, as camadas médias se distribuindo sobre o território e as camadas populares ocupando em sua maior parte áreas do miolo e do subúrbio.

A análise espacial toma importância no âmbito de representar que além das discussões envolvendo as questões socieconômicas, as quais veremos a seguir, mostram que o próprio traçado da cidade, seguindo seus vetores de expansão e investimentos estão longe de abranges as classes mais pobres, e sobretudo, onde estão concentrados a maior proporção de pardos e pretos. No que podemos perceber, a segregação socioespacial na cidade carrega também um peso sobre a segregação racial, na medida em que fatores históricos contribuíram para a configuração atual, mas também as gestões governamentais que não priorizaram as áreas menos integradas, e ano após ano continuam sem um planejamento correto para que esses conflitos sejam sanados.

Tipologias de ocupação do solo em Salvador
Tabela 1.
Tipologias de ocupação do solo em Salvador
Fonte: Ferreira, 2009. Adaptado pelas autoras, 2021.

Tipologias de ocupação do solo em Salvador
Tabela 2.
Tipologias de ocupação do solo em Salvador
Fonte: Ferreira, 2009. Adaptado pelas autoras, 2021.

5. Considerações finais

A questão da segregação socioespacial está atualmente associada ao debate em favor de instrumentos do planejamento urbano, frente à esfera prática cotidiana e da participação popular para com as decisões tomadas sobre o espaço público. A densidade urbana, cada vez mais consolidada nas cidades, torna-se um índice de correlação entre densidades residenciais, formas urbanas, e integração espacial.

Entre caminhos possíveis de gestão e participação da sociedade, é preciso retratar que o debate deve ser feito considerando os próprios instrumentos de planejamento. Há certa tendência em substituir a questão técnica pela questão participativa, decorrente da pouca visibilidade sobre procedimentos e critérios de análise urbana que sejam atualizados e compatíveis com a diversidade das cidades brasileiras, levando em conta o comportamento e desempenho dessas cidades.

No entanto, não se deve abrir mão dos instrumentos de planejamento existentes ou das inovações, mas reconhecer as limitações que cada método estabelece e trabalhar para superá-las. Tratar de instrumentos e ações pensados em escala local podem estimular novos arranjos espaciais e novos tipos de configuração e uso dos locais, com impactos positivos sobre o sistema urbano, considerando a dinâmica espacial das cidades e suas complexidades.

Em Salvador, partindo da perspectiva da produção do espaço urbano, constatou- se uma visão de como os poderes hegemônicos determinam o sentido do traçado e expansão urbana, delimitando a forma com a qual a cidade se configura, indicando potenciais e deficiências sobre como o desenvolvimento urbano pode ser mais bem planejado em atuações em pontos críticos e assertivos que devem ser tratados com prioridade sobre a cidade.

A expansão urbana de Salvador resulta em processos contraditórios de concentração das áreas centrais e de dispersão para as franjas periurbanas. Observa-se que a segregação é provocada pelas formas de ocupação sobre o espaço urbano e reforçada pelo padrão de mobilidade e integração, criando cidades dentro da própria cidade.

Compreende-se que as transformações do presente atualizam os velhos processos que marcam as desigualdades socioespaciais e a segregação. Em Salvador, é possível perceber que o setor imobiliário desempenha um papel de protagonista sobre o direcionamento e o crescimento urbano, tornando a configuração da cidade cada vez mais heterogênea e desigual.

No cenário atual, propor políticas públicas que realmente beneficiem a população como um todo se torna um desafio, quando as pesquisas censitárias revelam que Salvador constitui-se cada vez mais desproporcional, em vista da disparidade socioeconômica entre os estratos sociais, o que pode ser visualizado nos mapas apresentados, e destacado nas análises sobre os mesmos engendradas.

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Notas

[1] Os mapas foram divididos em 6 faixas de análise, considerando a distribuição por quebras naturais, que se refere à análises onde os valores dos dados de mapeamento que não são uniformemente distribuídos, mas tendem a agrupar valores como valores agrupados de locais de quebras naturais na mesma classe. Desta forma, as 6 faixas de análise servem para dividir as classificações, acompanhando a divisão de Kronemberger (2016).
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