Papeles de investigación

Uma rosa no meio do atlântico: a sociogênese da editora caboverdiana Rosa de Porcelana

A rose in the middle of the Atlantic: a sociogenesis of the Cape Verdean publishing house Rosa de Porcelana

Marcello Giovanni Pocai Stella
Universidad de San Pablo, Brasil

El taco en la brea

Universidad Nacional del Litoral, Argentina

ISSN: 2362-4191

Periodicidade: Semestral

vol. 9, núm. 15, 2023

eltacoenlabrea@gmail.com

Recepção: 17 Agosto 2021

Aprovação: 18 Outubro 2021



DOI: https://doi.org/10.14409/tb.2022.15.e0063

Para citar este artículo: Stella, M.G.P. (2022). Uma rosa no meio do atlântico: a sociogênese da editora caboverdiana Rosa de Porcelana. El taco en la brea, (15) (diciembre–mayo). Santa Fe, Argentina: UNL. e0063 DOI: 10.14409/tb.2022.15.e0063

Resumo: Apesar da globalização neoliberal ter sido considerada como um movimento de expansão da livre circulação de mercadorias em um espaço econômico mundial, como nota, tanto bens econômicos quanto simbólicos têm encontrado constrições diversas para atravessar fronteiras. Tentando fazer uma análise que supere o nacionalismo e o monolinguismo metodológico este artigo tenta dar conta da emergência de uma editora fundada em Cabo Verde. Criada em 2013 pelo casal Filinto Elísio (cabo-verdiano) e Márcia Souto (brasileira) a editora Rosa de Porcelana opera atualmente entre o arquipélago de Cabo Verde e Portugal. No presente conta com um catálogo de mais de 50 livros e desde 2017 organiza em seu país de fundação o Festival Literatura Mundo do Sal que em parceria com diversas instituições portuguesas, brasileiras e africanas, tenta se colocar como um ponto de encontro e uma ponte entre os continentes Europeu, Africano e Americano. Baseado em entrevista realizada com os editores, e em pesquisa documental sobre suas atividades, tal visada sobre sua trajetória editorial e pessoal busca uma reflexão sobre a luta contra heranças coloniais que insistem em se fazer presentes e a procura pela construção de novas geografias e geopolíticas literárias pós-coloniais.

Palavras-chave: s: Cabo-Verde, edição independente, edição africana, PALOP, lusofonia.

Abstract: Although neoliberal globalization has been considered as a movement to expand the free circulation of goods in a world economic space, as a note, both economic and symbolic goods have encountered different constraints to cross borders. Trying to make an analysis that overcomes nationalism and methodological monolingualism, this article tries to give an account of the emergence of a publishing house founded in Cape Verde. Created in 2013 by the couple Filinto Elísio (Cape Verdean) and Márcia Souto (Brazilian), publishing house Rosa de Porcelana currently operates between the archipelago of Cape Verde and Portugal. It currently has a catalog of more than 50 books and since 2017 it has organized the World of Salt Literature Festival in its founding country, which, in partnership with several Portuguese, Brazilian and African institutions, tries to position itself as a meeting point and a bridge between the European, African and American continents. Based on an interview carried out with the editors, and on documentary research about their activities, this approach to their editorial and personal trajectory seeks a reflection on the struggle against colonial legacies that insist on being present and the search for the construction of new geographies and literary geopolitics postcolonials.

Keywords: Cape Verde, independent edition, African edition, PALOP, lusophony.

Introdução

Apesar da globalização neoliberal ter sido considerada como um movimento de expansão da livre circulação de mercadorias e pessoas em um espaço econômico mundial, como nota Pierre Bourdieu (2002), tanto bens econômicos quanto bens simbólicos têm encontrado barreiras e constrições diversas para atravessar fronteiras. Daí a necessidade de se pensar como instituições e agentes tem se movimentado e circulado suas produções entre enquadramentos nacionais, supranacionais e transnacionais (Sapiro, 2019). Tentando fazer uma análise que supere o nacionalismo e o monolinguismo metodológico (Leperlier, 2020) este artigo tenta dar conta da emergência de uma fundada em Cabo Verde no ano de 2013. Baseado em entrevista realizada com os seus criadores, o cabo verdiano Filinto Elísio e a brasileira Márcia Souto, e em pesquisa documental sobre suas atividades, tal visada sobre suas trajetórias editoriais e pessoais busca uma reflexão sobre a luta contra heranças coloniais que insistem em se fazer presentes e a procura pela construção de novas geografias e geopolíticas literárias pós-coloniais.

Estudos recentes em sociologia da literatura como os de Claire Ducournau (2017), Madeline Bedecarre (2018) e Tristan Leperlier (2020) tem chamado a atenção para a necessidade deste ramo da sociologia da cultura de matriz bourdieusiana, direcionar suas lentes para estudos de instituições literárias (prêmios, festivais, editoras, revistas literárias, etc.) como forma de constituir um modelo alternativo de crítica pós-colonial. Se trata de mostrar os movimentos de manutenção de dominação e de produção de assimetrias materiais e simbólicas promovidos pelas antigas metrópoles através de organizações literárias, políticas e econômicas nacionais, supranacionais e transnacionais. Como exemplo, podemos citar o trabalho de Bedecarre (2018) sobre os prêmios literários criados no quadro da francofonia institucional, que segundo a autora, se tratam de formas de autoperpetuação e recriação da noção mesma de francofonia. Em outras palavras, através de prêmios, festivais e organismos francófonos, a antiga metrópole mantém um controle sobre a circulação, consagração e legitimação de literaturas de países independentes e com mercados simbólicos nacionais emergentes.

Se por um lado os antigos impérios visam alimentar laços de pertencimento com suas antigas colônias, naturalizando estes laços e as classificações deles derivadas, por outro lado, um grande conjunto de iniciativas e de agentes tem batalhado para contrabalancear tais políticas. É o que tentaremos mostrar a partir do trabalho efetuado pela editora cabo-verdiana Rosa de Porcelana fundada e gerida por Filinto Elísio e Márcia Souto.

Vale ressaltar que a iniciativa de Souto e Elísio em criar uma editora e começar do zero um empreendimento literário e cultural não se trata de um fato isolado no panorama da edição dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (daqui em diante referidos pela sigla PALOP). Entre outros projetos que surgiram nas duas primeiras décadas do século XXI podemos listar: os editores, Sandra Tamele (da Trinta Zero Nove de Moçambique), Miguel de Barros e Tony Tcheca (da Corubal de Guiné-Bissau), Abdulai Sila (da Kusimon de Guiné-Bissau), Luiz Vicente (da Nimba Edições de Guiné-Bissau/Portugal), Ondjaki (da Kacimbo, editora angolana criada pelo próprio autor) e Mbate Pedro (da Cavalo do Mar, de Moçambique).

Todos os projetos mencionados tem por característica central o trabalho de resistência ao domínio das lógicas econômicas no trabalho editorial (como por exemplo, a opção por publicação de trabalhos que não visem somente o interesse comercial, mas que se pautem por outros critérios como de [biblio]diversidade ou artísticos), a criação e estímulo a novos públicos leitores, valorização de línguas africanas maternas e da publicação e edição de autores africanos em África, o estímulo a novas geografias e geopolíticas literárias (como maior integração entre os PALOP sem a intermediação de Portugal ou Brasil e a construção de pontes editorais com países africanos de outras áreas linguísticas).

Criadas, sobretudo, a partir da década de 2010 os projetos editoriais mencionados também procuram preencher lacunas deixadas pela expansão dos grandes conglomerados transnacionais de edição e resistir a políticas e espaços controlados pelas antigas metrópoles. Não obstante essas políticas, o recurso a instâncias transnacionais e ou nacionais dos antigos impérios ainda se faz necessário, como por exemplo, a participação na Feira de Frankfurt no Invitation Programme, iniciativa da Feira em parceria com a UNESCO que, mais intensamente desde os anos 2000, convida editores independentes de regiões «periféricas» do mundo da edição para workshops, treinamentos e networking durante a realização do evento em Frankfurt a cada ano (as editoras 30.09, Cavalo do Mar e Rosa de Porcelana foram contempladas com bolsas para participação na Feira através deste programa).

Como veremos mais adiante a iniciativa de Filinto Elísio e Márcia Souto, de produzir livros traduzidos em língua cabo-verdiana (crioulo) e a criação de um festival literário sediado em seu arquipélago natal apontam para saídas e soluções editoriais e culturais contra hegemônicas.

Em um primeiro momento tento tratar do conjunto emergente de editores independentes dos PALOP do qual a Rosa de Porcelana faz parte, ao mesmo tempo em que procuro indagar o conceito de editor e edição independente, traço um panorama da história editorial dos PALOP e qual é o seu momento atual. Em seguida em seção dedicada ao trabalho de Elísio e Souto, reconstruo rapidamente suas trajetórias biográficas e editoriais para dar conta de esmiuçar seu projeto editorial e as estratégias que vem pondo em prática para (r)existir a um panorama editorial nacional complexo e a um espaço transnacional pleno igualmente de oportunidades e de constrições.

Esboço para uma história da edição nos Países Africanos de Língua Portuguesa

Este artigo é um resultado parcial de uma pesquisa de doutorado mais ampla intitulada Literaturas de língua portuguesa: escritores em um espaço literário transnacional.1A pesquisa como um todo sobre a edição independente nos PALOP conta com 12 entrevistas semiestruturadas (10 delas foram feitas através de videoconferência, uma foi respondida por e-mail - por um editor sénior de uma editora transnacional de Moçambique -, as conversas decorreram entre outubro de 2020 e março de 2021, durante a pandemia de Covid-19; o encontro com Elísio e Souto se deu remotamente em outubro de 2020).

O único fundador e proprietário não entrevistado foi Ondjaki, devido às dificuldades em definir um calendário para a conversa. Um primeiro dado a ser trabalhado é o problema de anonimato dos entrevistados nestes estudos. Na maioria das vezes, manter um nome não identificado nesses setores muito restritos é quase impossível, então as editoras e os editores serão citados por extenso na maioria das vezes, e tentaremos preservar suas estratégias e identidades individuais quando se fizer afirmações coletivas sobre a edição em todos os países, ou quando forem referidos os modos de vida e às diferentes atribuições sociais ou atitudes em relação à profissão e ao mundo editorial.2

O tempo coberto por este artigo remonta ao início do século XXI e termina na sua segunda década. Analisaremos em um primeiro momento as editoras e seus proprietários fazendo recurso principalmente ao trabalho seminal de Sophie Noël sobre a edição independente na França, de 2012. Noël examina a edição crítica de ciências sociais e humanas francesa, também qualificada, principalmente por seus protagonistas, de subversiva e engajada.

Apesar de não estarmos olhando para editoras científicas e políticas, e nossa população cobrir empreendimentos de vocação mais literária, algumas características apontadas por Noël (2012) permanecem relevantes. Como ela nota o surgimento de um número significativo de editoras autodenominadas independentes está relacionado a uma grave crise econômica que a indústria e o mercado de livros estavam enfrentando durante as décadas de 1980 e 1990. Para a autora a criação de uma abundância de pequenas estruturas editoriais desempenhou um papel de contrarresposta à generalização de severas restrições econômicas no mundo editorial.

Ainda que neste cenário apocalíptico, a expansão mercantil permitiu às editoras recém-criadas explorar alguns nichos de mercado deixados ao largo pelos gigantes do setor. É nessa posição que encontraremos o espaço independente de publicação. Este espaço descrito pelos achados de Noël (2012) e estes relacionados as primeiras impressões que tenho advindas das entrevistas transcritas, mostram algumas características semelhantes, bastante impressionantes.

Antes de avançar destaco também pesquisas recentes no Brasil como a de Muniz Júnior (2016) e na Argentina, Analia Gerbaudo (2020) e Santiago Venturini (2019), que juntamente com diversos outros pesquisadores e pesquisadoras vem estudando o universo editorial, desde suas iniciativas mais disruptivas, como as editoras cartoneras, até as editoras independentes mais tradicionais, bem como festas e festivais literários.

Retomando, uma primeira similaridade com as descobertas de Noël (2012) é a posição instável da edição independente em relação à economia, à política, à universidade e à literatura. As editoras se esforçam para manter um equilíbrio entre essas quatro esferas da vida social, mas se trata sempre de uma operação muito conturbada e delicada, pois manter uma relativa independência de tais espaços implica que se deve contar com alguns deles em determinados momentos, mas não completamente e indefinidamente. Não é possível, portanto, apoiar-se em uma única dimensão, sob pena de perder autonomia política ou econômica, ou valor literário ou crenças e valores políticos e de engajamento crítico.

Logo, estes(as) editores(as) estão sempre lidando com a necessidade de encontrar soluções, financiamentos, parcerias, projetos que atendam aos seus desejos e expectativas, e também às suas necessidades essenciais para sobreviver. Neste caso específico, o dos PALOP, acresce ao exposto, que tudo se passa em mercados relativamente desfavoráveis para a literatura.

Ao mesmo tempo, essa posição precária, pode ser vista como um lugar de alto valor simbólico, pois remete aos valores fundacionais do campo literário: a crença no poder transformador, emancipatório e revolucionário das palavras e da literatura, sua capacidade insurgente intrínseca e de promoção de uma sociedade e uma cidadania melhor, assim como de mais educação e liberdade.

Em suma, podemos afirmar que essas editoras e editores vivem em posições sociais fortemente clivadas, entre a precariedade econômica e uma atribuição de valor simbólico altamente positiva de seu ofício. Isso tudo se passa em espaços editorial bastante restritos e frágeis, com bordas porosas e em permanente disputa. Vale destacar, que a noção de independência, é sempre uma categoria relacional. Ou seja, ela existe na medida em que estabelece uma relação de distanciamento ou proximidade a outras esferas sociais, portanto, deve ser sempre examinada à luz de situações sócio-históricas bem localizadas e verificada a partir do sentido empregado por cada agente individual em relação a sua posição no espaço social em que está inserido.

A seguir tentarei traçar uma linha do tempo concisa da construção da edição nos PALOP, para isto proponho quatro períodos históricos, semelhantes aos definidos por Hamilton (1994): 1. Anos coloniais (fim do século XIX até metade do século XX), 2. Anos pós-coloniais de esperança (de meados dos anos 1970 até o início dos anos 1980), 3. Meados dos anos 1980/1990: Encruzilhadas econômicas e políticas e 4. Renovação e re-independência? (2000-2020).

Obviamente não pretendo esgotar o assunto, contudo, acredito que o esquema da trajetória da edição das literaturas africanas de língua portuguesa passe por balizas semelhantes, com algumas variações importantes dependendo das especificidades de cada país.3

É no final do século XIX e início do século XX que se dá a instalação das primeiras máquinas de imprensa ligadas a administração colonial, destinadas a impressão de boletins oficiais da metrópole e ao começo da publicação dos primeiros jornais, onde alguns naturais da terra e missionários cristãos escreviam, basicamente o que se poderia chamar de elite da época colonial. Isso acontece mais cedo em Angola e Moçambique, pela metade do século XIX (entre 1842 e 1857), Cabo-Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe só para o fim do XIX, de 1879 em diante. Esse movimento do final do XIX, coincide com os acordos da Conferência de Berlim realizados em 1884-1885 e a necessidade de os portugueses comprovarem uma ocupação efetiva dos territórios africanos que reivindicavam perante outras potências europeias. O fato é que até esta data, boa parte da colonização portuguesa se restringia a postos e entrepostos comerciais no litoral dos países e uma ou outra base para reabastecimento destinada a facilitar o ingresso no interior do continente.

Ainda neste primeiro momento, conforme relembra Hamilton (1994) e Moser (1993), já chegando à metade do século XX, uma nova produção literária se dá em jornais e revistas,4 dessa vez realizada por autores alinhados a reivindicações com cores nacionalistas e críticas ao domínio colonial, podemos citar a revista Claridade (1936-1966) em Cabo Verde; Mensagem (1951-1952) e Cultura (1957-1961) em Angola e Itinerário em Moçambique (1941-1953). Além destas revistas baseadas no continente africano, uma outra revista Mensagem (1949–1964), sediada na Casa dos Estudantes do Império, agremiação de jovens oriundos das colônias portuguesas para estudar na metrópole, que se constituiria em celeiro de líderes e apoiadores das libertações nacionais, editava poesia crítica de seus membros angolanos, moçambicanos, cabo verdianos, são tomenses e guineenses (Moser, 1993). É nesta mesma instituição que o primeiro livro com a ideia de «literatura africana de expressão portuguesa» surge, resultado de um trabalho conjunto do escritor e intelectual angolano Mário Pinto de Andrade com o poeta são tomense Francisco José Tenreiro, intitulado Caderno de poesia negra de expressão portuguesa (1953). O angolano ainda publicaria mais dois livros, uma Antologia de poesia negra de expressão portuguesa (1958, Paris) e Literatura africana de expressão portuguesa (em 2 volumes, na cidade de Alger, nos anos de 1967 e 1968) (Hamilton, 1994).

Com as lutas anticoloniais de libertação em relação à Portugal e os movimentos independentistas que pouco a pouco vão assumindo o controle dos territórios e optando por governos socialistas de matizes diversos, mas, em geral, com uma característica comum de centralização de poder nas máquinas burocráticas estatais e a adoção do monopartidarismo. Os novos governos investem em um modelo de editora oficial, os Institutos Nacionais do Livro e do Disco, que são criados nos anos 1970 juntamente, na maioria dos casos, com as Uniões ou Associações Nacionais de Escritores.

Quadro 1.
Uniões e Associações de Escritores dos PALOP
Uniões e Associações de Escritores
dos PALOP
Elaboração própria com dados da pesquisa e das entrevistas realizadas com os editores e Magnier et al., 1993a, 1993b, 1994.

Quadro 2.
Uniões e Associações de Escritores dos PALOP
Uniões e Associações de Escritores
dos PALOP
Elaboração própria com dados da pesquisa e das entrevistas realizadas com os editores e Magnier et al., 1993a, 1993b, 1994.

Todas essas instituições literárias se inspiram no modelo soviético de Uniões de Escritores, e de reestruturação do espaço literário através de uma centralização estatal das infraestruturas culturais e literárias (Dragomir, 2007). De acordo, com Lucia Dragomir (2007), antes de se espalharem por todos os países do Leste Europeu quando da formação do bloco soviético, a primeira União de Escritores surgiu a partir de decisão do Comitê Central do PCUS (Partido Comunista da União Soviética) de 23 de abril de 1932 que estipulava congregar todos os escritores sob a plataforma de poder soviético, liquidando assim a possibilidade de existência de outras associações de autores, que não aquela ligada ao partido único.

Em se tratando de espaços literários recentemente criados e adensados (Casanova, 2002; Helgesson, 2011; Leperlier, 2020) e com pouca autonomia relativa a outras esferas sociais, a criação de organizações nacionais únicas para o agrupamento de escritores, se torna um trunfo político dos novos dirigentes e carrega consigo a possibilidade permanente de intervenção política no campo literário em detrimento de suas regras próprias de funcionamento e da autonomia artística do escritor. Por isso, não é de se estranhar, como mostra Flavia Landgraf (2018), conflitos e protestos quando da criação da Associação dos Escritores Moçambicanos (AEMO). Esses espaços são, conforme Dragomir (2007) e Landgraf (2018), lugares privilegiados de observação de tensões e ambivalências entre o espaço político e o literário nos PALOP. As Uniões e Associações, em alguns casos mais ou menos poderosas, terão todavia impactos duradouros na configuração dos espaços literários nacionais, isto devido ao monopólio que exerceram durante muito tempo no setor da edição de livros e enquanto instituições que detinham o poder de consagração/legitimação de novos(as) escritores(as), assim como de fazer circular obras.

Não obstante esses tensionamentos, tanto as Uniões de Escritores, quanto os Institutos serão responsáveis pela produção de livros à baixo custo e em larga escala,5 que serão impressos ou nas imprensas nacionais remanescentes do período colonial, ou nas impressoras dos jornais, aproveitando-se de sua infraestrutura, ou ainda, como no caso de Angola haverão parcerias com editoras portuguesas (como a Edições 70). Neste caso os livros eram produzidos em Portugal e levados de avião para Angola. Esta última estratégia de publicação, como se pode notar a partir das entrevistas reunidas na coletânea de Magnier (1994) e pela entrevista realizada para esta pesquisa com o escritor Pepetela (antigo Ministro da Educação de Angola e antigo membro da União dos Escritores), era viável pois os escritores da UEA conseguiram uma taxa de câmbio favorável a importação de livros de Portugal. Funcionava assim, o antigo editor do selo Edições 70, Joaquim Soares da Costa, amigo do escritor José Luandino Vieira —que nos anos 1960 trabalhou para Soares da Costa na editora e costurou o acordo—, imprimia uma quantidade de livros para serem vendidos em Portugal e outra maior para ser enviada para Angola, com o logotipo da UEA em sua capa, ao custo de pouco mais de um ou dois dólares. A UEA pagava a edição de, por exemplo, 6000 exemplares, desses 1000 ficavam em Portugal para serem comercializados por Soares e outros 5000 eram despachados para Angola. Estes quando chegavam, devido a política cambial do Banco Nacional de Angola, de pareamento com o dólar, custavam algo como um a dois dólares, em moeda nacional angolana, da época, o Kwanza, significava 30 a 60 Kwanzas, o que colocava o livro entre os produtos mais baratos que havia, mais barato até do que frutas.

Na mesma coletânea de Magnier (1994) e na entrevista concedida por Pepetela, coincidem os marcos de esgotamento dessa política de popularização e barateamento dos livros. Rapidamente de edições que vendiam 60 000 a 300 000 exemplares, em poucos anos, passa-se a livros que demoram de cinco a dez anos para vender 10 000 exemplares.

Este momento de declínio é motivado por diversos fatores internos de cada país mas em alguma medida todos vivenciaram conjuntamente a partir dos anos 1980-1990: os efeitos da crise econômica internacional e local (devido as políticas econômicas de planificação e de câmbio adotadas, a dependência de matérias primas, falta de infraestrutura, extrema pobreza, oscilações dos preços do petróleo, etc.), conflitos e guerras civis internas, peso do declínio da URSS e do bloco de países soviéticos/comunistas e socialistas (que não podiam mais apoiar tecnicamente, comercialmente e militarmente os países africanos até ali bastante associados a eles) e por fim um último fator que paradoxalmente estimulará a criação de editoras privadas que é a crescente interferência de organizações internacionais nas políticas públicas e financeiras africanas, notadamente o FMI e o Banco Mundial.

O estímulo a adesão dos PALOP a políticas neoliberais de diminuição de aplicação orçamentária e capacidades estatais (que resultou em uma redução do poder dos partidos e elites partidárias no controle da máquina estatal) de investimento em diversas esferas da vida social (notadamente na cultura e educação), acabou por abrir espaço para a emergência dos primeiros projetos editoriais privados nos PALOP.

Em todos os casos, mesmo onde não houve presença destacada do FMI ou Banco Mundial, a conjunção de fatores de crise mostra a realização de uma transição abrupta de economias estatais centralizadas para economias de mercado mais descentralizadas. A retração do Estado acabou gerando também a necessidade de associação à intermediários culturais locais como ONGS e outras instituições culturais transnacionais para angariar financiamentos para projetos de edição de livros, no caso de não se poder ou querer fundar uma nova editora.

Há uma fase de transição entre os anos 1990 e 2000, onde vemos editoras como Ilhéu Editora (1989, Cabo Verde), Chá de Caxinde (1989, Angola), Kusimon (1994, Guiné-Bissau), Ndjira, Nzila (1996, Moçambique e Angola) —essas duas últimas associadas a editora portuguesa Caminho, posteriormente incorporadas em conjunto pelo grupo Leya em 2007—, Alcance (2007, Moçambique) e Índico Editores (2007-2008, Moçambique), que foram casas que enfrentaram período extremamente turbulento e que passada a tempestade conseguiram, em sua maioria, retomar seu caminho, isto ao final da década de 2000 início da de 2010, quando se dá o encerramento de conflitos internos e um processo de estabilização, com formulação de arranjos para a paz e consolidação de regimes políticos mais democráticos e se amplifica o multipartidarismo. Não obstante, este novo cenário, todos os editores entre o século XX e o XXI enfrentaram grandes dificuldades, paralisando ou trabalhando em descontinuidade muitas vezes por uma década.

A Kusimon, dentre as citadas, foi a editora que retomou sua trajetória com maior vigor e se recolocou entre as editoras recém criadas: Corubal, Rosa de Porcelana, Cavalo do Mar (esta é herdeira da experiência do seu editor com a Índico Editores), Trinta Zero Nova (30.09), Kacimbo e Nimba.

Enfatizo alguns desafios que eles(as) estão enfrentando e algumas inovações que estão promovendo a partir do caso da Rosa de Porcelana na próxima seção. Antes passemos brevemente em revista a alguns dados de origens sociais dos(as) editores(as):

Quadro 3.
Editoras e Editores Independentes de Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e Portugal.
Editoras e Editores Independentes de Angola, Cabo Verde,
Guiné-Bissau, Moçambique e Portugal.
Elaboração própria com dados da pesquisa e das entrevistas realizadas com os editores.

Como se pode notar, a maioria dos(as) editores(as) vem de origens muito humildes e desprivilegiadas, apenas um entre oito é filho de altos funcionários; na maioria dos casos, vemos filhos(as) de professores primários, trabalhadores industriais, médicos e prestadores de serviços. Metade dos pais tem apenas o ensino fundamental ou é analfabeta, principalmente as mães. A maior parte dos parentes atingiu pelo menos um nível de escolaridade próximo do bacharelado, ou o concluiu (alguns dos editores são filhos de pais que se engajaram diretamente nas lutas de libertação, mas em sua maioria não se tornaram altos funcionários dos partidos no pós-independência). Todos(as) os(as) editores(as) possuem pelo menos um diploma de graduação (arquitetura, sociologia, medicina, engenharia, administração, literatura e biblioteconomia) mostrando um claro movimento de ascensão social e educacional em relação aos seus pais. Sete de oito possuem algum grau de pós-graduação ou especialização mais próximo da literatura, ou de políticas públicas. A maioria nasceu no final da década de 1970 e início da década de 1980, apenas 2 nasceram na década de 1960.

Apesar das diferenças qualitativas, podemos afirmar que a maioria dos editores tem origens populares e são a primeira geração de membros pós-graduados de suas famílias. Muito bem educados e treinados, têm acesso a conhecimentos valiosos para ajudar na administração de seus territórios de origem, mas na maioria dos casos veem esse caminho bloqueado devido à elite dos partidos dominantes no poder no plano nacional, portanto, para alguns deles a editora é também um meio de prestar um bom serviço público aos seus países, publicando material técnico e histórico importante, para influenciar os decisores governamentais, ou para ajudar a desenvolver competências e ferramentas literárias para as camadas mais jovens entre os seus concidadãos.

A maioria das editoras é administrada por seus próprios fundadores sem funcionários, apenas dois ou três têm funcionários contratados, não ultrapassando uma equipe de dois ou três membros. Portanto, os selos dependem quase inteiramente da própria capacidade de trabalho de seus idealizadores. Isso impõe uma série de restrições: jornadas diárias muito carregadas e cronogramas extremamente apertados, etc. O catálogo ativo das editoras na maioria dos casos não chega a mais de 30 livros, a média é de 20 livros publicados por editor. Futuramente pretendo realizar uma análise mais detida de cada catálogo, mas só para mencionar neste texto, destaco um grande número de obras poéticas editadas, seguidas por peças teatrais, livros de ciências sociais e ensaios de história, e alguns livros infantis (em boa parte traduções). Esses tipos de escolhas de gêneros literários constituem uma estratégia bem conhecida das editoras independentes (Noël, 2012; Venturini, 2019), trocando em miúdos, procura-se explorar os gêneros literários deixados à margem por grandes grupos editoriais, que por sua vez os consideram menos luc-rativos e mais arriscados.

Embora não haja espaço nesse momento para comentar caso a caso cada estratégia de cada selo, optei por esmiuçar o caso da caboverdiana Rosa de Porcelana, por apresentar quatro tendências bastante significativas no panorama da edição independente dos PALOP: busca de edição e circulação de autores africanos no interior dos PALOP, Brasil e Portugal; preocupação com a edição de livros em língua nacional crioula, criação de um festival próprio e grande enfoque na produção e promoção de eventos culturais e recurso à instâncias e instituições trans(inter)nacionais, tais como feiras de livros e outros projetos transnacionais, como saída a espaços editoriais nacionais frágeis e monopolizados por grandes conglomerados e instituições literárias criadas no pós-colonização. Vejamos a trajetória da Rosa de Porcelana e de seus editores Elísio e Souto.

Uma editora transnacional dentro do universo de língua portuguesa

Através da reconstituição das trajetórias Elísio e Souto, bem como da sócio-história da construção de sua editora, creio que podemos avançar na argumentação que propusemos no início do artigo, cujo cerne é entender os projetos editoriais já mencionados e o do casal de editores como movimentos de contrarresposta e formulação de novas geografias e geopolíticas literárias pós-coloniais, não alinhadas a hegemonia de grandes conglomerados transnacionais (Bourdieu, 1999; Leperlier, 2020; Nöel, 2012; Thompson, 2013). Além disso, como sugerido no último parágrafo da seção anterior o projeto da Rosa de Porcelana permite delinear tendências marcantes do conjunto de editoras independentes apresentadas.

Filinto Elísio é nascido em 1961 na cidade de Praia em Cabo Verde, filho de professores e intelectuais, ao contar brevemente sobre suas origens sociais e menciona um forte incentivo de sua família para que se aproximasse das artes e das Letras. Filinto se formou em Biblioteconomia na Unversidade Federal de Minas Gerais e tem também formação em administração de empresas. Antes de se tornar editor foi professor em Sommerville nos Estados Unidos e assessor do Ministro da Cultura de Cabo Verde (cf. Leite, Secco, Falconi, Krakowska, Khan, 2018). Além disso, o editor é poeta, tendo escrito mais de cinco livros de poesias em língua portuguesa.

Já Márcia Ferreira Souto é de Itabuna na Bahia. Ao relatar sua história familiar a editora conta que foi um de seus tios o responsável por ser seu mentor intelectual, que era poeta e foi uma forte influência para que optasse por se inscrever no curso de letras da UFMG que concluiu em 1999. Lecionou durante um bom tempo língua portuguesa e literatura brasileira em escolas de Minas Gerais e depois realizou uma especialização e um mestrado em literaturas de língua portuguesa com foco em literaturas africanas de língua portuguesa. Ambos foram realizados na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, o último resultou em uma dissertação intitulada Estratégias narrativas e identidades deslizantes em Venenos de Deus, remédios do Diabo, de Mia Couto, defendida em 2011, com orientação da especialista brasileira em literaturas africanas de língua portuguesa Maria Nazareth Soares Fonseca. No ano de 2011 se tornou Coordenadora Editorial da Universidade de Cabo Verde.

Márcia e Filinto casaram-se em 2011 e somente fundaram a editora em 2013, mas como podemos ver se tratam de duas pessoas com grande experiência, formação e especialização na área educacional, cultural e literária. Esse preparo advindo de suas experiências pessoais, educacionais e profissionais, pode ser considerado como um importante capital de conhecimentos, que serviu de lastro para que investissem em uma empreitada própria no campo editorial. Nos últimos anos e por conta da editora o casal se estabeleceu em Lisboa e vive desde então entre o arquipélago e o continente europeu.

Como veremos mais adiante a Rosa de Porcelana das editoras consideradas é a que tem um fundo de catálogo mais vasto (56 livros) e também, devido a criação do festival, mas a experiência de Elísio no serviço público caboverdiano conta com importante rede apoio e suporte político, que gera parcerias importantes para a realização de do Festival Mundo do Sal que criaram em 2017 e para realização de eventos de divulgação e promoção de livros e autores, em embaixadas e centros culturais, caboverdianos, brasileiros e portugueses em diversos países (França e Alemanha, por exemplo).

Além do catálogo amplo e das conexões política, a editora é a que mais parece se apropriar do espaço editorial lusófono e suas instituições (CPLP, Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, IILP —Instituto Internacional de Língua Portuguesa—, IC —Instituto Camões—, Prêmio Oceanos, Festival Internacional de Óbidos, etc.). Essa aproximação da lusofonia institucional, que emula em muitos aspectos a francofonia institucional (cf. Bedecarre, 2018; Ducournau, 2017), se deve a uma concepção própria de Filinto Elísio sobre o tema, a qual expressa em diversas entrevistas concedidas aos mais variados veículos, vejamos uma delas:

Cidadania lusófona, para mim, é descortinarmos, nós os da língua portuguesa, os pontos comuns e convergentes de forma a termos direitos de cidadania a partir da identidade percepcionada como plural e diversa, mas partilhável. A CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa), na minha opinião, deveria investir mais na pertença coletiva dos lusófonos, permitindo-lhes direitos comuns, não só na miríade dos países de língua oficial portuguesa, mas nas várias comunidades de língua portuguesa na diáspora. Sermos a quinta maior língua do mundo, para além de muito destino histórico partilhado, deveria conferir uma cidadania específica, se calhar, diferenciada daquela nacional. Estou a pensar na mobilidade de pessoas e bens, algo que deveria estar a acontecer, com mais fluidez e facilidade, na CPLP. (Elísio apud Júnior, 2019, p. 1)

Assim como a maioria dos entusiastas, Elísio pensa a lusofonia (e a CPLP) como tendo sua origem em uma identidade linguística e em um patrimônio sociocultural comum. Tornando-a, portanto, não só uma área geográfica linguística, mas uma identidade compartilhada e imaginada (cf. Mourão, 1995). E dentro da identidade lusófona a identidade caboverdiana seria uma das mais privilegiadas para a efetivação e prática de um diálogo que respeite a unidade, a diversidade e as diferenças no interior da área de língua portuguesa. Pois, na concepção do editor, a própria identidade caboverdiana seria sempre acumulativa, baseada em um amplo processo de mestiçagem e canibalismo cultural, um encontro que plasmou e amalgamou diversas culturas notadamente europeias e africanas (cf. Elísio apud Leite et al., 2018, p. 105).

A particularidade caboverdiana residiria no impulso a uma constante instabilidade de sua identidade crioula, devido a característica insular do país. Sendo um arquipélago formado por dez ilhas, com pouco mais de 500 000 habitantes, localizado na região central do Atlântico e a 570 quilômetros da costa africana ocidental, o país é marcado por um clima extremamente seco e, por ter terras de origem vulcânica, seu solo é de difícil cultivo. Esses fatores motivaram muitos episódios de fomes e secas generalizadas, que mataram milhares de habitantes, motivando massivos e importantes movimentos migratórios da população local (França, 1993).

Tais migrações promoveram a formação de uma ampla diáspora em todas as partes do globo, e o intercâmbio do arquipélago com sua diáspora rende uma permanente possibilidade de trocas culturais, pessoais, econômicas e políticas, conferindo a população caboverdiana uma grande plasticidade identitária, como sugere Elísio em suas entrevistas.

Essas concepções de identidade lusófona e caboverdiana do editor da Rosa de Porcelana confluem, a meu ver, em um projeto de catálogo, que como destaca Nöel (2012) e Venturini (2019), serve de indicador expressivo da posição e singularidade de seu editor. O catálogo, portanto, constitui como que uma identidade que deixa impressa a marca da editora. No caso temos uma que deseja para promover Cabo Verde, que procura colocar o país não como uma soma de pequenas ilhas literárias, mas de afirmar Cabo Verde como um centro geoestratégico da língua portuguesa, como uma ponte entre os diversos atores que compõem a lusofonia.

Vejamos a lista de autores e autoras já publicados pela Rosa de Porcelana:

Quadro 4.(1)
Livros e Autores(as) do catálogo da Editora Rosa de Porcelana até maio de 2021
Livros e Autores(as) do catálogo
da Editora Rosa de Porcelana até maio de 2021
Elaboração própria com dados de https://rosadeporcelanaeditora.blogspot.com/

Quadro 4.(2)

Elaboração própria com dados de https://rosadeporcelanaeditora.blogspot.com/

Publicações anuais
da Rosa de Porcelana de 2013 até maio de 2021
Gráfico 1.
Publicações anuais da Rosa de Porcelana de 2013 até maio de 2021
Elaboração própria com dados da pesquisa

Com um fundo de 56 livros até maio de 2021, desde a sua fundação a editora tem publicado em média 7 livros por ano. A partir do quadro 4 podemos identificar uma maioria de autores (n=62) homens 71 % e uma minoria de autoria feminina de 29 %. Em relação a nacionalidade o catálogo é composto majoritariamente por autores africanos 71 % (42 caboverdianos/as, 2 angolanos/as e 1 são tomense). O restante (30 %) é composto de 10 portugueses(as), 5 brasileiros(as), 1 polonesa e 1 Chinês. Os gêneros literários predominantes são a poesia com 21 livros, romance com 8, ensaio com 6 e livros de história com 4 títulos. Em seguida Conto e Crônica contam com 3 obras cada, 2 para coletâneas de Cartas e peças de Teatro, e 1 livro para Arte, Autobiografia, Biografia, Entrevista, Infanto-juvenil e Pedagogia.

Diferentemente, por exemplo, do caso da editora moçambicana Trinta Zero Nove, fundada em 2018, de Sandra Tamele (2021) que baseia seu catálogo majoritariamente em traduções, e conforme outros projetos destacados por Nöel (2012) e Venturini (2019) que se utilizam da tradução de autores estrangeiros como forma de montagem de um catálogo, o vetor de tradução da Rosa de Porcelana se dá entre seus próprios autores de língua portuguesa que são versados para o crioulo ou língua caboverdiana. Foram dois os livros que passaram por essa tradução, o de poesias de José Luis Peixoto, Bu More-m de 2019 e outro de Gonçalo M. Tavares, Bedjus tanbe kre vive do mesmo ano.

Apesar de falado pela maioria da população em sua vida cotidiana o crioulo caboverdiano não é considerado como língua oficial do país. Esse papel cabe ao português que seria falado por aproximadamente 75 % segundo levantamento de Reto (2020). Apesar de pouco usado pelos caboverdianos em seus lares e na sua intimidade, como nota Elísio (Leite et al., 2018) a língua portuguesa é a língua de acesso ao poder, ao Estado e língua de uso literária de escritores e também da elite política.6

Assim não é estranho notar a grande presença de políticos caboverdianos no catálogo, entre eles, até mesmo o presidente, Jorge Carlos Fonseca, que será presença frequente também nos festivais literários organizados por Souto e Elísio. Além desse traço vale destacar a publicação de uma biografia sobre Cesária Évora e uma epistolografia do líder revolucionário Amílcar Cabral com sua esposa, ambos livros entram na missão de diplomacia cultural encampada pelo casal, seja representando Cabo Verde, ou em sentindo mais amplo, como representantes de toda a língua portuguesa. Por fim vale destacar a presença de autores premiados no espaço da língua portuguesa, como Arménio Vieira, José Luis Peixoto e Gonçalo Tavares. Como nos contam em entrevista, principalmente os dois últimos, dedicam à Rosa de Porcelana obras de gêneros menos demandados (teatro e poesia) pelos grandes conglomerados editoriais em que estão publicadas suas prosas (romances, contos, etc.).

Se o catálogo aponta para a tentativa de integração e publicação de autores de todos os países de língua portuguesa, ele também apresenta limites se compararmos a presença de livros de autoria angolana, são tomense, moçambicana, brasileira e portuguesa, com a vinda de pesquisadores, escritores, tradutores e editores das mesmas nacionalidades para o Festival literatura Mundo do Sal.

Tal festival literário criado por Souto e Elísio estreou em 2017 e teve uma edição a cada ano até 2019 (em 2020 e 2021 não houve o evento devido a pandemia de Covid-19). Os festivais literários tem funcionado na cena internacional cada vez mais como espaço para a construção de uma esfera pública alternativa, mas para além dessa característica apontada por Sapiro et al. (2015), eles servem igualmente para reavivar a crença no valor simbólico da literatura, assim como também podem ter uma componente mais política, cultural ou econômica.

Conforme os editores nos contam em depoimento o Festival Literatura Mundo do Sal, cujo nome é referência a uma das ilhas do arquipélago, é pensado como uma forma de projeção do país, como uma plataforma de promoção dos autores da própria editora e dos livros caboverdianos e por fim como um evento de debate acadêmico sobre as literaturas luso-afro-brasileiras, atualmente conta inclusive com a curadoria científica da professora são tomense Inocência Mata, sendo que no início teve como parceiro importante um dos autores do selo, José Luís Peixoto. Vejamos as nacionalidades de todos os convidados em todas as edições:

Nacionalidade de convidados de
todas as edições do Festival Literatura Mundo do Sal entre 2017 e 2019
Gráfico 2
Nacionalidade de convidados de todas as edições do Festival Literatura Mundo do Sal entre 2017 e 2019
Elaboração própria com dados da pesquisa

De 121 convidados em 4 edições do Festival na capital do arquipélago, Praia, incluindo uma extensão realizada em Portugal na cidade de Lisboa e uma participação online em 2019 no FOLIO – Festival Literário Internacional de Óbidos, temos uma presença majoritária de caboverdianos como no catálogo editorial, mas uma proporção muito mais significativa de brasileiros(as) e portugueses(as), além de outras nacionalidades africanas como um convidado nigeriano e outro moçambicano e uma maior diversidade de países, sejam latino-americanos, europeus ou asiáticos. Além dessa diferença outra diferença significativa é a relação de gênero, que se torna mais igualitária, as mulheres presentes no festival foram 43 % (53 em números absolutos, dos convidados(as)) enquanto os homens foram 56 % (68 em números absolutos), lembrando que essa relação no catálogo é, respectivamente, de 29 % contra 71 %.

Tais números chamam a atenção para as dificuldades de os livros atravessarem fronteiras, e parece sugerir que autores(as), pesquisadores(as), editores(as) e tradutores(as) circulam mais em eventos do que suas próprias obras, mostrando as constrições e barreiras à tradução e a circulação das produções culturais na língua dominante no interior de uma área linguística7 (Leperlier, 2020).

O investimento em instituições literárias não se limita somente ao Festival, Elísio conta em entrevista a Leite et al. (2018) que também foi um dos fundadores da Academia Cabo-verdiana de Letras. Apesar de serem o Instituto do Livro e da Biblioteca Nacional de Cabo Verde serem os responsáveis pelas políticas do livro desde a independência do país em 1975, ambos sempre sofreram com falta de financiamento adequado para tocar todas as tarefas vinculadas as suas responsabilidades, tanto que até o final dos anos 1980, segundo Varela (1993), a edição de livros pelo ICLD girava em torno de sete livros por ano.

Apesar da relativa fraqueza de seus institutos nacionais e biblioteca, e da própria criação tardia de uma associação de escritores centralizada, Cabo Verde faz parte de um movimento encontrado em praticamente todos os PALOP que desde a década de 2010 viram surgir agremiações literárias que tentam se desvincular do controle de partidos políticos dominantes ou do Estado. Não obstante, muitas vezes, façam parte das academias escritores que são ao mesmo tempo políticos ou membros da elite política local. Assim, não é coincidência que boa parte dos caboverdianos publicados pela Rosa de Porcelana são membros desse novo projeto associativista africano (Vera Duarte, Arménio Vieira, Jorge Carlos Fonseca, José Luis Tavares, entre outros e outras), que toma forma entre autores e autoras de academias ou Pen-clubs, em oposição as antigas Uniões e Associações de inspiração soviética.

Independência e dependência relativa

Embora em todo momento da entrevista em profundidade realizada Elísio e Souto situem o projeto da editora Rosa de Porcelana como uma iniciativa 100 % privada que está fora do controle do Estado e que busca atuar numa perspectiva que busca não ser guiada por critérios estritamente comerciais, o fato é que para a sustentabilidade do negócio e para que possam estabelecer uma editora transnacional no espaço de língua portuguesa a todo momento os projetos da editora necessitam o estabelecimento de parcerias com instituições políticas e às vezes a invenção de instituições literárias que também estão em contato com as esferas da vida econômica e política.

Outro movimento que aponta para concessões necessárias a sobrevivência do negócio e sua profissionalização é a parceria da Rosa de Porcelana com a distribuidora europeia de livros Europress, a maioria das outras editoras mencionadas, pelo menos as com alguma sede europeia, como a Nimba edições, evitam os grandes distribuidores que facultam o acesso e distribuição dos livros em grandes livrarias, como Bertrand e FNAC.

É preciso compreender que nenhuma dessas questões invalida ou deslegitima a procura pela construção de novas geografias e geopolíticas literárias pós-coloniais empreendida pelos editores. Aliás, muitas de suas críticas à falta de uma articulação do espaço de língua portuguesa são centrais para o desenvolvimento de um espaço transnacional mais integrado de língua portuguesa, que permanece com instituições muito concentradas em Portugal e Brasil; problemas crônicos e preço elevado de transporte e frete entre os PALOP, Brasil e Portugal; impostos aduaneiros não homogêneos para os bens culturais, parques gráficos deficientes; baixa capilaridade de livrarias, sobretudo no continente africano, etc.

A atuação da Rosa de Porcelana e das outras editoras mencionadas vem tentando mudar o quadro de carências apresentado e mostrar também as potencialidades e ações disruptivas e contra hegemônicas que podem ser desenvolvidas no espaço de literaturas de línguas portuguesa, entre outras: a edição e circulação de autores africanos no interior dos PALOP, Brasil e Portugal; a preocupação com a edição de livros em língua nacional crioula, a criação de um festival próprio e grande enfoque na produção e promoção de eventos culturais e recurso à instâncias e instituições trans(inter)nacionais fora da língua portuguesa também.

Essa atuação aponta, como mostra Leperlier (2020), que nenhum espaço linguístico por mais centralizado que seja, tem na sua capital dominante um controle irrevogável, estável e permanente. Há, como mostra o projeto da Rosa de Porcelana e dos outros selos, sempre resistências e caminhos alternativos que lutam para instaurar novos tipos de relação entre literaturas, países e línguas, que sejam menos assimétricos e promovam sentidos de produção e circulação literária mais democráticos e diversos.

É esta atenção ao projeto editorial e de ação cultural mais amplo da editora e seu entrecruzamento e aproveitamento de diferentes escalas (local, nacional, inter(trans)nacional) que buscamos perseguir, para evitar uma leitura que estabeleça de maneira apriorística e irrefletida fronteiras econômicas, políticas e culturais naturalizadas. Assim, ao mesmo tempo que buscamos escapar do nacionalismo metodológico pela via da construção de fronteiras pertinentes e seus múltiplos efeitos e impasses para os atores, também tivemos sempre presente que no espaço linguístico da língua portuguesa, seu domínio não é inconteste e absoluto. Para escapar ao monolinguismo metodológico é sempre importante destacar que nenhum idioma reina absoluto em uma área linguística, mesmo nas mais centralizadas como a francesa (Leperlier, 2020). Isto se evidencia pela atenção da Rosa de Porcelana ao crioulo cabo-verdiano, e tal fato não é algo isolado entre seus pares, Kusimon e Corubal publicam em crioulo da Guiné-Bissau, e a editora Moçambicana, Trinta Zero Nove, tem buscado trabalhar nas principais línguas nacionais moçambicanas (Sena, Changana e Mácua) (Tamele, 2021). Assim, ao invés de tomarmos o português como idioma inconteste e de uso corrente, devemos desnaturalizar sua já assumida centralidade e colocá-lo em tensão com as línguas locais, comumente as mais faladas oralmente e agora, com as editoras independentes, também começando suas jornadas mais sistematicamente nos meios impressos.

Como sugere Noël (2012), esperamos com o estudo circunscrito de um conjunto de editores independentes dos PALOP e um olhar mais focado em uma trajetória específica, possa ter tido por efeito reverso apreender as grandes lógicas editoriais, a contraface e contrarresposta a atuação de grandes grupos e de dinâmicas editoriais extremamente concentradas globalmente (Bourdieu, 1999; Thompson, 2013).

A edição é sempre também um negócio e há sempre uma vasta possibilidade de estabelecer compromissos com as esferas econômicas e políticas por parte dos editores independentes que possam ajudar a manter seus selos, e sua própria sobrevivência, viáveis. O que não implica sempre que uma opção mais voltada ao lado comercial ou mesmo político da edição significa comprometimento da independência do projeto editorial, por vezes, e como ressalta Nöel (2012), a possibilidade de independência econômica é parte mesma, da possível independência de um projeto editorial.

Referências

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Notas

1 O projeto de doutorado iniciado em 2019 conta com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) por meio de bolsa de doutorado no país, registrada com o número de processo 2018/25486-7. A ele se vinculou igualmente uma Bolsa de Estágio de Pesquisa no Exterior (BEPE) com o número de processo 2019/20750-0.
2 Apesar de ainda não incluídas entre as editoras pesquisadas, destaco as editoras Ethale Books e Fundza de Moçambique. Seus dois fundadores, respectivamente, Jessemusse Cacinda e Dany Wambire foram entrevistados e seus catálogos e trajetórias serão incorporados futuramente.
3 É sempre fundamental destacar as importantes tradições orais pré-coloniais desses países, que terão um papel decisivo nos anos de luta pela Independência, e nas literaturas pós-coloniais emergentes, especialmente na poesia, por isso não pretendemos afirmar que a história literária desses países começou com a chegada do colonizador, mas sugerimos que o esquema de evolução da edição das literaturas dos PALOP é basicamente o mesmo, não obstante algumas variações importantes a depender de cada contexto nacional.
4 Para mais detalhes sobre a história da imprensa nos PALOP ver Isadora Fonseca (2019) e para o caso da Guiné-Bissau ver António Lopes (Tony Tcheka) (2015).
5 Essa política de publicação de larga escala e a baixo custo visava popularizar a literatura nacional nascente e fornecer livros para abastecer o sistema de ensino massivo que começava a ser colocada em prática.
6 Como mencionado, Elísio é também poeta e como se vê no catálogo da Rosa de Porcelana, tem seus próprios livros editados pelo selo que criou. Tal fato, não é incomum entre o grupo de editores e editoras que apresentamos. Em muitas entrevistas, notadamente a de Abdulai Sila da Guiné-Bissau, a criação da editora é justificada como um movimento dos próprios autores e autoras para encontrarem um espaço de publicação para as suas próprias obras, contornando as dificuldades 1) em serem publicados em seu país, por ausência e/ou selos desinteressados por autores locais, 2) Terem que publicar seus livros na antiga metrópole obrigatoriamente. As editoras muitas vezes surgiram dessa necessidade de publicação das próprias obras e posteriormente ganharam contornos mais amplos, a Rosa de Porcelana também se enquadra parcialmente nesses casos.
7 Vale notar que graças ao festival e a iniciativa de um convidado, Eric M. B. Becker, editor da revista literária on-line Words Without Borders, produziu-se um número temático desta última traduzido para o inglês sobre a literatura cabo-verdiana contemporânea, incluindo, texto versado para o inglês do editor da Rosa de Porcelana (cf. Words Without Borders, 2020).

Informação adicional

Para citar este artículo: Stella, M.G.P. (2022). Uma rosa no meio do atlântico: a sociogênese da editora caboverdiana Rosa de Porcelana. El taco en la brea, (15) (diciembre–mayo). Santa Fe, Argentina: UNL. e0063 DOI: 10.14409/tb.2022.15.e0063

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