A "cura gay" sob a ótica dos direitos humanos e sexuais: questões jurídicas acerca das terapias de reorientação sexual no Brasil
DOI:
https://doi.org/10.14409/redoeda.v6i1.8757Palavras-chave:
direitos sexuais, cura gay, terapias de reorientação sexual, resolução CFP 01/99, homossexualidade egodistônicaResumo
A proposta deste trabalho é analisar as controvérsias acerca da Resolução 01/99 do Conselho Federal de Psicologia, ato normativo que proibiu psicólogos de praticarem as chamadas terapias de reorientação sexual, popularizadas como “cura gay”. A partir dos conceitos de direitos sexuais e políticas sexuais, entendidos aqui como pressupostos necessários para uma compreensão mais holística da gestão social da questão no Brasil, tomou-se como foco os recentes embates em torno da Resolução 01/99 no âmbito do poder judiciário, abordando-se a legítima competência normativa do CFP para a edição do ato, assim como sua efetiva constitucionalidade material, sob a ótica do direito constitucional interno e também dos Sistemas Universal e Interamericano de Proteção aos Direitos Humanos. Tratou-se ainda da questão específica da homossexualidade egodistônica, sua retirada das principais classificações internacionais de doenças e as perspectivas de práticas terapêuticas apropriadas. A pesquisa se deu através de revisão bibliográfica orientada acerca da questão, busca em documentos e jurisprudência de órgãos internos e internacionais. Na medida em que diversas tentativas de revogação da Resolução 01/99 vem ocorrendo nas últimas décadas, seja por via legislativa ou judicial, evidencia-se a importância do debate em torno das terapias de reorientação sexual para a defesa de direitos fundamentais.
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